Mundo Geek Feminino

Crítica: Agente Carter

Para quem não conhece ou não viu, a série Agente Carter, que teve duas temporadas e ainda pode ser vista no serviço de streaming Disney+, mostrou a vida da personagem Peggy Carter das HQs da Marvel. Peggy, que foi o grande amor de Steve Rogers, o Capitão América, e uma combatente que se aliou aos franceses para combater os nazistas na Segunda Guerra.

Umas das coisas legais é que a mesma atriz que fez Peggy no MCU, a lindíssima e talentosa Hayley Atwel, foi a mesma que a interpretou na série. O enredo da série deu seguimento às histórias de Peggy nos filmes e partiu do ponto após a morte de Steve. Mostrando como ela seguiu sua vida após a perda do seu grande amor, mas dando foco total na personagem e sua vida como uma heroína nas sombras, já que devido à época machista que se vivia nos anos 40, ela quase não recebia os méritos devidos. A série deu a chance para aqueles que admiram a personagem, tanto no MCU quanto nas HQs, de conhecê-la melhor e ver o quão forte e talentosa é.

A primeira temporada começa mostrando Peggy depois de retornar para a América com o fim da guerra, e diferente da HQ em que a personagem fica reclusa por anos após a morte de Steve, na série é mostrada uma mulher mais forte, que continua sua carreira e o desejo de servir a um bem maior, mesmo com o luto pelo seu grande amor. Peggy encontra-se trabalhando secretamente na Reserva Científica Estratégica (SSR em inglês, RCE em português).

Enquanto seus amigos comuns pensam que ela é apenas uma simples telefonista, ela é a mais brilhante e ousada agente de campo, mas como as pessoas da época não entenderiam bem esse trabalho, uma telefonista era mais fácil de explicar e de despistar curiosos. O fato de não entenderem sua profissão não a incomodava tanto, o problema é quando a tratavam como telefonista ou recepcionista na própria agência, pois lá, eles a conheciam bem, sabiam o que ela fazia, mas por trabalhar em um meio onde os homens predominam, eles se sentiam intimidados por ela e suas histórias vitoriosas, e tentavam a todo custo diminui-la pelo simples fato de ser mulher.

Eles tentam impedi-la de ir em missões, pois veem que essa é uma profissão para homens lutadores e poderosos e não para uma mulher bonita e de aparência frágil. Quando Peggy insiste com ideias e planos, eles a desmerecem e não aceitam suas opiniões e experiências anteriores de campo, fazem com que ela sirva café ao invés de participar das reuniões dando palpites. Mesmo com tudo para que Peggy desista e se sinta desmotivada, ela não se intimida, e enquanto serve o café, ainda tem tempo de escutar a reunião e elaborar estratégias perfeitas para solucionar os casos.

Tentaram introduzir um par romântico para Peggy, que segue uma vida de solteira por um bom tempo, como se não tivesse superado bem a morte de Steve. O personagem Daniel Sousa, interpretado pelo ator Enver Gjokaj, chega a tentar algo a mais com ela e no final acaba se afastando por perceber que não seria possível uma relação com alguém que ainda tinha o coração comprometido. De certa forma, isso foi bom, pois mantem a série com uma pegada de ação e ficção, sem o melodrama que relações amorosas muitas vezes envolvem.

Não que fosse ruim ver ela com alguém e feliz, mas acaba que, por não ter um par romântico, o foco de suas ações como agente se destacam mais ainda, mostrando que a mulher não precisa ser par romântico para ser uma boa personagem. Isso evita também que o parceiro venha em seu socorro, que geralmente é o que acaba acontecendo em histórias onde a mulher se envolve em uma relação e acaba virando a mocinha que precisa ser salva pelo amado.

E esse, é um dos motivos pelos quais a série se destaca mais ainda, pois Peggy é vista como a salvadora, aquele que precisa salvar ao invés de ser salva. Este fato é confirmado pela trama da temporada, que conta com Howard Stark, pai de Tony Stark, interpretado pelo ator Dominic Cooper, pedindo ajuda à Peggy após ser acusado de traição ao país por vender armas ilegalmente. Howard, que conheceu Peggy na época de Steve, sabe o quanto ela é boa, comprometida e confiável, a única que naquele momento terá a sensibilidade de acreditar nele e ajudá-lo.

Ele sabe que ela terá a determinação e coragem para investigar a fundo a história e pegar os verdadeiros vilões. Enquanto ele está foragido, ela conta com ajuda do Edwin Jarvis, interpretado pelo ator James D’Arcy, o mordomo do Howard, para apoiá-la com deslocamentos e equipamentos. Mas é só isso mesmo, pois coragem não é o forte dele, que sempre se assusta com a capacidade de Peggy de encarar o perigo sem nem hesitar por um momento sequer.

E assim, Peggy segue até chegar ao final da primeira temporada, onde finalmente consegue limpar o nome de Howard Stark, salvar o mundo da arma perigosa que ele inventou e ainda ganha o respeito de todos da agência, por seus feitos heroicos, ousados e que levaram a vitória sob os vilões. Porém quem acaba levando os créditos pelos atos de heroísmo da moça é seu colega de trabalho Jack Thompson, interpretado pelo ator Chad Michael Murray.

Na cena final da primeira temporada, onde todos estão aplaudindo Peggy por ter salvo o mundo, um supremo da agência chega e elogia Thompson em seu lugar, ele aceita sem nenhum remorso, mesmo com todos sabendo que ele não fez nada, pois quem os merecia é Peggy. Contudo, ninguém se opõe, já que a maioria ali no momento são homens. Eles acabam aceitando o ato covarde do colega e o apoiam, sem o desmentir.

Inicialmente a cena cria revolta, claro! Mas a atitude de se calar de Peggy nessa cena e não desmentir o colega de trabalho foi uma amostra de sua personalidade forte, onde para ela não importa o que os superiores acham dela ou que o mundo não saiba que ela os salvou, pois ela sabe seu valor, sabe que foi ela que realizou o feito, foi ela quem lutou, ela é a heroína. E a sensação de dever cumprido, que fez o bem, vale mais do que o que possam pensar dela.

Na segunda temporada, Peggy segue ainda como agente de campo, sem a valorização merecida, as mesmas questões problemáticas que as mulheres dessa época sofriam continuam a ser abordadas em diversas cenas e muitas vividas pela própria Carter. Os problemas com o personagem Thompson continuam, mas agora ele é o superior dela, promoção que ele ganhou às custas do heroísmo de Carter na primeira temporada. Mas a reviravolta empolgante da segunda temporada é a vilã que Carter enfrenta, sendo ela a Madame Máscara, interpretada pela atriz Wynn Everett. A chegada dessa personagem, deixou a trama de igual para igual, pois o que antes era uma mulher tentando sobressair em meio aos homens, agora é entre duas mulheres, onde uma é heroína e a outra vilã.

Sendo Peggy uma mulher forte e que escolheu ser uma heroína sem nada em troca, e do outro, a Madame Máscara, que também é uma mulher forte e poderosa, mas que só queria mais poder através da matéria escura e se vingar das pessoas que não a deixaram evoluir intelectualmente. Mostrando que você pode escolher o que quer ser, independente do que lhe aconteceu ao longo da vida. Outra personagem da série que foi marcante e apareceu desde a primeira temporada foi a personagem Dorothy “Dottie” Underwood, interpretada pela atriz Bridget Regan. Ela é uma assassina soviética treinada na Academia da Sala Vermelha, uma Viúva Negra. Ela deu um trabalhão para a agência, e a única que conseguiu lidar com ela foi Peggy, pois era tão boa quanto ela em combate e estratégia. A cena das duas lutando foi maravilhosa, digna de um filme de cinema.

Enfim, tanto a primeira temporada quanto a segunda foram ótimas, apresentando bem os personagens, aprofundando as histórias além do que as HQs mostraram, dando ótima valorização e representatividade para as figuras femininas, em meio a cena de óbvio protesto quanto a calar a voz da mulher. Essa série é atemporal, pois independente do momento em que for vista, ela irá inspirar as mulheres e lhes dar força, voz e esperança, pois mostra que as mulheres podem sim fazer diferença, podem ser boas no que elas quiserem ser, podem escolher seus caminhos. Uma pena ter terminado de forma tão repentina, deixando buracos nas histórias que obviamente teriam continuidade na sequência da terceira temporada. Uma solução seria que fosse realizado um filme, pelo menos para dar um fim digno a essa série tão inspiradora, que trouxe Peggy Carter para essa posição de heroína, sem poderes, que apenas tem a vontade e coragem de fazer a diferença para o bem maior.

Compartilhe este post!